“Acredito que, se tal tivesse acontecido, sempre me teria alertado. Se foi ele quem me informou sobre o assunto, não podia eu congeminar o que quer que fosse de preocupante na informação recebida”, justificou Azeredo Lopes, que está acusado de denegação de justiça e prevaricação, favorecimento pessoal praticado por funcionário, abuso de poder e denegação de justiça.
Questionado pela Lusa sobre em que data teve conhecimento de que a recuperação das armas furtadas em Tancos era uma encenação, Azeredo Lopes assegurou que só soube “quando toda a gente teve conhecimento”, garantindo que “até à data em que foram efetuadas as primeiras detenções, em setembro de 2018, ignorava por completo a possibilidade de terem sido praticados factos com contornos ou relevância jurídico-criminal”.
Segundo a acusação, Azeredo Lopes teve conhecimento da encenação e aceitou-a e podia ter-se oposto e participado a irregularidade à PGR e PJ.
No dia do achamento, dizem os procuradores, o ministro recebeu um telefonema da então procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, para lhe transmitir a falta de correção, do ponto de vista jurídico, da atuação da Polícia Judiciária Militar (PJM) e lamentar o facto de não ter conseguido falar com o ex-diretor da PJM Luís Vieira, agora arguido no processo.
Na resposta, cita a acusação, o ministro disse que estava “profundamente contente” com a recuperação do armamento e que isso era o essencial e o mais importante.
Questionado sobre o assunto, Azeredo Lopes relatou à Lusa que, no dia do achamento das armas (18 de outubro de 2017), Joana Marques Vida comunicou-lhe telefonicamente “o seu desagrado com a intervenção da PJM, tendo também referido que poderia haver matéria para procedimento disciplinar”.
“Ficou assente, como confirmado pela própria, que em princípio me enviaria a participação para ser encetado o procedimento disciplinar. Nunca o fez, como também explicou, pelo facto de dias depois ter determinado a abertura de um inquérito-crime sobre o assunto. Desconhecendo eu essa decisão, presumi que a então procuradora-geral tivesse considerado sanado o incidente que me tinha reportado a 18 de outubro”, descreveu.
Indagado pela Lusa se falou ao telefone com o coronel Luís Vieira no dia em que este entregou no Ministério da Defesa o memorando sobre o furto e recuperação das armas, Azeredo Lopes confirmou.
Sobre o teor da conversa, o ex-ministro disse que lhe transmitiu “apenas e só o teor do telefonema da procuradora-geral da República”.
Para o Ministério Público, a recuperação do armamento furtado dos paióis de Tancos em junho de 2017 deve-se a um “verdadeiro pacto de silêncio entre Azeredo Lopes e os arguidos da GNR, PJM e que todos criaram sérios obstáculos à descoberta da verdade material”.
Azeredo Lopes demitiu-se do cargo a 12 de outubro de 2018.
Nove dos 23 arguidos do processo de Tancos são acusados de planear e executar o furto do material militar e os restantes 14, entre eles Azeredo Lopes, da encenação que esteve na base da recuperação do equipamento.
O armamento foi furtado a 28 de junho de 2017 e recuperado na Chamusca a 18 de outubro do mesmo ano.
As declarações prestadas à agência Lusa surgem depois de Azeredo Lopes ter sido interrogado na segunda-feira a seu pedido na fase de instrução do processo.