Arrancou ontem na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores o debate das Orientações de Médio Prazo para a atual legislatura e do Plano e Orçamento da Região para 2013. A manhã ficou marcada pela apresentação de dois cenários antagónicos das finanças regionais: se Governo e PS fazem dos Açores um mapa cor de rosa, demarcando-se completamente da situação que se vive a nível nacional, a oposição faz uma leitura diferente, considerando que a situação da Região é cada vez mais insustentável e reconhecendo ao Governo açoriano culpas no cartório.
Coube ao vice-presidente do Governo, titular da pasta das Finanças, iniciar o debate. Sérgio Ávila destacou as virtudes dos documentos orientadores, salientando o facto de permitirem “responder aos desafios atuais” e “dar continuidade à estratégia de desenvolvimento regional” ao mesmo tempo que oferecem às empresas e famílias açorianas mecanismos para fazer face à crise.
Apesar do debate se destinar à análise dos documentos orientadores regionais, Sérgio Ávila apontou baterias ao Governo da República, aproveitando a terceira revisão em baixa das previsões macroeconómicas para 2013: 19% de taxa de desemprego ainda este ano, um desequilíbrio orçamental superior ao de 2011 e a maior dívida pública de sempre são, para Ávila, sinais de que a receita do Governo da República não está a resultar.
O vice-presidente fez questão de demarcar a Região do resto do país, lembrando que, “pelo terceiro trimestre consecutivo, a Troika dispensou os Açores do processo de avaliação que decorreu para o resto do país”. Sérgio Ávila pediu união regional para impedir que os Açores paguem por um crime que não cometeram, lembrando que a Região não contribuiu “com um cêntimo” para o desequilíbrio orçamental nacional e que a sua dívida pública é seis vezes menor que a do país.
Apontando o combate ao desemprego como a prioridade para 2013, Sérgio Ávila destacou também o reforço de verbas na Saúde, para combater a crise no setor, bem como a necessidade de criar um novo ciclo de investimentos, que já não passará pela construção de infraestruturas. De acordo com o responsável pelas finanças regionais, é importante também começar já a trabalhar com vista ao melhor aproveitamento do próximo quadro comunitário de apoio, em vigor a partir de 2014.
Menos 68 chefias na Orgânica Regional
Sérgio Ávila anunciou ainda cortes na despesa, nomeadamente a redução de 20% dos cargos de chefia regional, ainda este ano. Em resposta a esclarecimentos solicitados pela oposição sobre este assunto durante o debate, o vice-presidente explicou que serão reduzidas 68 chefias na orgânica regional, o que permitirá poupar mais de 4 milhões de euros.
Oposição preocupada com desemprego
A oposição rebateu o cenário traçado por Sérgio Ávila com uma visão bem diferente da realidade regional e acusou o Governo dos Açores de sacudir a água do capote em relação à crise na Região, culpando o Governo da República e as suas políticas de austeridade ou a conjuntura internacional desfavorável.
Para a oposição, o Executivo regional tem culpas no cartório e uma prova disso é a incapacidade que tem revelado em combater o desemprego.
“Temos o maior desemprego da autonomia. Este é o Governo do desemprego, que fala grosso contra a República na esperança de que os açorianos não percebam o que está a fazer”, acusou António Ventura, considerando que a atuação do Executivo em áreas estruturais como o Turismo tem sido “incompetente”. O deputado do PSD acusou ainda o Governo de não cumprir os compromissos eleitorais, dando como exemplo as bolsas de investigação atribuídas pela Região, prometidas antes de outubro e que agora estão postas em cheque.
Ainda da bancada do PSD, António Marinho interveio para reforçar as preocupações com o desemprego, lembrando que neste momento os Açores têm 20 mil desempregados. Para o social-democrata, o Governo Regional não pode atribuir a culpa destes números à crise internacional ou à austeridade na República, e a prova disso é que a “trajetória de queda” do emprego em setores como Turismo ou Construção Civil começou em 2006, antes do surgimento dos sintomas da crise internacional.
Para Marinho, existem ainda outros números que devem ser vistos como um sinal de que a situação na Região não é famosa: o deputado lembra que, no último ano, as receitas do IVA baixaram nos Açores cerca de 14%,enquanto que a nível nacional a quebra foi de 2%, ao passo que o IRC caiu 43% na Região, contra os 17% a nível nacional.
Também o líder da bancada do CDS-PP chamou a atenção para o desemprego, que entre 2001 e 2011 cresceu 700% na Região e destacou a crise nos setores da Saúde e da Construção Civil. Artur Lima mostrou também que ainda não digeriu a necessidade, plasmada no Memorando de Entendimento assinado entre Açores e Lisboa, de dar conta dos documentos previsionais ao Ministério das Finanças antes da sua aprovação na Assembleia Regional, que considera ser uma “submissão da Autonomia”.
Para Zuraida Soares, o Plano e o Orçamento para 2013 são a prova de que Vasco Cordeiro não pretende cumprir a promessa de governar em contra ciclo com as políticas de austeridade da República. A deputada do BE está preocupada com o desemprego jovem, que já ultrapassa os 40%, e com as derrapagens que caracterizam as obras públicas na Região.
Aníbal Pires entende que o Governo Regional não promove políticas que resultem na criação de empregos, procurando, ao invés, “financiar os lucros das grandes empresas”. Também o deputado do PCP não aceita que os documentos orientadores da Região tenham passado por Vítor Gaspar antes de chegar à Assembleia Regional: “estes são o Plano e o Orçamento que o Governo da República impõe e que o Governo do PS na Região invertebrada e fielmente defende”, disse. Recorde-se que Pires apresentou na segunda-feira uma série de propostas de alteração aos documentos.
A apresentação do Plano e do Orçamento a Lisboa também não agradou a Paulo Estevão, que considera que isso representa um condicionamento da liberdade autonómica e parlamentar. O deputado do PPM alerta também para o facto deste ser um Orçamento excessivamente “dependente”, em que as receitas próprias da Região representam apenas 40% do bolo orçamental e não chegam nem para cobrir as despesas de funcionamento. Estevão acusa ainda os sucessivos governos socialistas de “empreendimentos megalómanos” que provocaram passivos orçamentais gigantes, como as SCUT’s. A falta de estratégia para o setor produtivo, o turismo e os transportes, bem como a alocação de verbas “muito diminutas” à área social são outras críticas apontadas por Estevão.