Cineclube da Horta assinala uma década de vida

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Hoje, dia 24 de janeiro, o Cineclube da Horta (CCH) assinala uma década de vida. A associação cultural sem fins lucrativos destacou-se pela dinamização do Faial Filmes Fest (FFF), festival de cinema que trouxe à Horta grandes referências do cinema português e até algumas figuras de reputação internacional, como é o caso do brasileiro Fernando Meirelles. No entanto, dez anos depois da sua fundação, o CCH está parado, tendo inclusive cancelado a última edição do FFF, que se deveria ter realizado no final de outubro passado. Causa? As dificuldades financeiras.


O CCH nasce em 2003, “da vontade de estimular a consciência crítica e a participação social, divulgando o cinema alternativo de qualidade, e envolvendo a comunidade nos processos mágicos que fazem o Cinema”, como pode ler-se na apresentação da instituição no seu sítio online. Dos objectivos do recém-nascido cineclube faziam parte “integrar um circuito independente de divulgação de cinema, com destaque para o cinema português e europeu, participar ativamente na vida cultural da Região, dar formação na área da fotografia, cinema, vídeo e multimédia e desenvolver atividades na área da produção cinematográfica e multimédia”.

Alguns meses depois da sua criação, o CCH vê ser suprida uma lacuna de anos na vida cultural faialense, com a inauguração, em junho de 2003, do Teatro Faialense, reparado e remodelado depois de seis anos de obras. No tempo em que esteve sem Teatro, o Faial não dispunha de sessões de cinema regulares, contando apenas com exibições ocasionais, promovidas pela Casa da Cultura. Com a reinauguração do Teatro, voltam a estar reunidas condições para a projeção regular de filmes e o CCH arranca, no final do ano, com a exibição regular de filmes, privilegiando obras fora do circuito mais comercial, já que os filmes com essas características estavam assegurados pela Hortaludus, empresa municipal responsável pela gestão do Teatro.

Faial Filmes Fest

Em 2005, o CCH leva a promoção do cinema a um novo nível, ao organizar a primeira Mostra de Curtas-Metragens Faialenses. Os cineastas locais responderam à chamada e foram exibidas 12 curtas-metragens. Nascia assim o Faial Filmes Fest (FFF).

O sucesso da primeira edição fazia adivinhar o crescimento desta mostra, que em 2006 assume as características de festival e conta com o alto patrocínio da autarquia. Nesse ano, a seleção oficial é composta por sete curtas, todas faialenses, e o festival integra ainda a exibição de alguns filmes fora da competição, com destaque para uma extensão do FIKE – Festival Internacional de Curtas-Metragens de Évora. Fotografia da Alma, de Luís Bicudo e Tiago Gonçalves, é o filme consagrado no primeiro ano de competição do FFF.

Em 2007 o festival volta a crescer, contando desta vez com o alto patrocínio da Direção Regional das Comunidades. A competição deixa de ser reservada apenas aos filmes locais, abrindo-se a todo o país, e surgem as sessões especiais, com as realizadoras Teresa Villaverde e Christine Reeh a marcarem presença. Em 2007 o CCH prepara um espetáculo de encerramento especial, exibindo o filme O Homem da Câmara de Filmar, com a banda sonora interpretada ao vivo. Neste ano o júri escolhe como melhor filme da competição nacional a curta Deus Não Quis, de António Ferreira, com Causa Sui, de João Rodrigues e Telmo Pacheco, a ser eleito o melhor filme faialense.

No ano seguinte, a quarta edição do FFF conta com um número recorde de inscrições. 2008 é marcado pela perda do escritor picoense Dias de Melo, e o FFF presta-lhe homenagem, numa edição que é também um tributo a Fernando Lopes, pai do cinema novo português, que vem ao Faial para a ante-estreia do seu filme O Meu Amigo Mike ao Trabalho. 2008 é também o ano em que o FFF rompe fronteiras, trazendo ao Faial o aclamado realizador brasileiro Fernando Meirelles, nomeado para o Óscar de melhor realizador em 2002 com o filme Cidade de Deus. Meirelles vem ao Faial apresentar Blindness, realizado a partir do livro Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago. Neste ano o Faial recebe ainda o Encontro Nacional de Cineclubes e o FFF estende-se às escolas, promovendo também vários workshops na área do cinema. Caravágio, de José Maria Vaz da Silva, vence a competição nacional, com Tudo por um gelado, de Crhiss, Jaen, Karina, Marisa, Joana e Cátia, a vencer os prémios regional e local.

Em 2009 o FFF volta a homenagear um grande nome do cinema português, desta feita Paulo Rocha, que veio ao Faial para a exibição do seu filme Os Verdes Anos. Nesta edição o FFF recebe ainda alguns dos filmes em destaque na actualidade cinematográfica nacional, como Um Amor de Perdição, de Mário Barroso, candidato português à lista de nomeados ao Óscar de melhor filme estrangeiro. Em 2009 a curta Arena, de João Salaviza, é a grande vencedora do festival, depois de, nesse mesmo ano, ter vencido a Palma de Ouro no Festival de Cannes. Na competição regional, A Natureza e o Engenho, de André Laranjinha, é a curta vencedora, com Insula, de Filipe Gomes, a ser considerado o melhor filme faialense. Ainda nesta edição, destaque para o concerto de encerramento, que trouxe ao Faial The Legendary Tiger Man.

Na sua sexta edição o FFF continua a crescer, tornando-se um espaço de celebração não apenas do cinema português mas, acima de tudo, da Lusofonia. 2010 é o ano de homenagem a Manuel de Oliveira, com o realizador a enviar uma mensagem, projetada antes da exibição do filme Painéis de São Vicente de Fora – Uma Visão PoéticaCanção de Amor e Saúde, de João Nicolau, é a curta vencedora do festival, e Passando à de Zé Marôvas, de Aurora Ribeiro, é escolhido como melhor filme das ilhas e melhor filme faialense.

Em 2011, ano marcado pela homenagem ao cineasta português António de Macedo, o festival abre a competição às longas-metragens. Nesta edição o FFF mostra o documentário É na Terra não é na Lua, de Gonçalo Tocha, sobre a ilha do Corvo, que havia de se destacar no panorama cinematográfico nacional. Sangue do Meu Sangue, de João Canijo, é a longa-metragem vencedora da competição, com O Ruído do Mar, de Ana Fernandes e Torsten Truscheit, a vencer o prémio de melhor-curta. Matança, de André Laranjinha é consagrado como melhor filme açoriano.

 

Em banho-maria

A chegada da crise económica aos Açores sentiu-se de imediato na cultura, com o CCH a cedo dar sinais de dificuldades. Há cerca de dois anos que o cineclube deixou de ter as exibições semanais de filmes no Teatro Faialense. Entretanto, também o FFF foi sofrendo constrangimentos, por força das dificuldades financeiras impostas.

Os apoios e patrocínios tornaram-se mais difíceis de angariar e a realização do FFF, que se tinha tornado já uma referência no circuito dos festivais de cinema que se fazem em Portugal, acabou mesmo por ser hipotecada. Em 2012 o festival não passou da gaveta.

A não realização do FFF teve impacto no tecido cultural da ilha, que sentia este evento como seu, orgulhando-se da sua projeção fora de portas. O seu timing – em plena época baixa do turismo no Faial, já que o festival se costuma realizar em outubro e novembro – contribuía também para trazer pessoas à terra numa altura em que os turistas não abundam, o que era um pequeno auxílio para que hotéis e restaurantes pudessem enfrentar a tão badalada sazonalidade. Agora, o FFF está parado, em banho-maria, não se sabendo para quando o seu regresso ou, sequer, se irá de todo regressar. Em banho-maria está também toda a atividade do CCH. Ao Tribuna das Ilhas, Alzira Luís, presidente da Assembleia Geral da instituição, explicou que esta situação se deve às dificuldades financeiras que o cineclube enfrenta. Aguardam-se agora melhores dias para que a festa do Cinema se possa voltar a fazer na Horta.

 

 

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