DAVID DOS SANTOS (1905-1998): Comerciante, armador de embarcações locais e político

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Nasceu na freguesia e concelho de Santa Cruz das Flores em 7 de fevereiro de 1905, filho de Francisco Santos e de Ernestina Adelaide Silva.
Na ilha das Flores, depois de concluir a instrução primária, viria a estabelecer-se com o pai e os irmãos em atividades comerciais e de laticínios, as quais o levavam frequentemente à ilha do Corvo. 
Nela acabaria por se enamorar da corvina Adelina Mendonça Santos, com quem casou em 23 de Junho de 1932. Fixou então residência na ilha do Corvo e desse casamento viria a nascer o filho David Francisco Mendonça Santos (1944-….) que foi Funcionário de Finanças e político, agora aposentado e residente na cidade da Horta. David dos Santos exerceu também atividade comercial de mercearias, fazendas, vinhos e análogos na ilha do Corvo. Mais tarde viria igualmente aí a ser armador de barcos de cabotagem destinados à pesca e ao transporte local, quer de cargas e descargas de navios, quer no seu transporte entre as ilhas do Corvo e das Flores. 
Pertencia-lhe o barco de carga “Rival” que, em Janeiro de 1945, viria a sofrer um grave acidente quando enfrentava as ondas do mar à saída do porto de Santa Cruz das Flores, por ter rebentado o cabo que o prendia à lancha a motor que o rebocava. Por esse motivo o barco encalhou nos baixios junto do Porto de Santa Cruz, partindo-se e afundando-se imediatamente. No acidente veio a falecer José Matias, que era um dos seis marinheiros do barco de David Santos1.
Acumulando a sua atividade privada com diversas atividades públicas, David dos Santos em 31 de Agosto de 1939 foi designado Administrador do Concelho do Corvo, cargo que desempenhou com seriedade, competência e dedicação. Assim, foi com agrado geral dos corvinos que, em 1952, assumiu a Presidência da Câmara Municipal do Corvo, ocupando o lugar que pertencera anteriormente ao comendador Manuel José de Avelar, que ali havia recebido em 1941 o Presidente da República, General Óscar Fragoso Carmona, o primeiro Chefe de Estado a visitar a ilha 2. Até aí fora ele que, ao ser empossado em 4 de Agosto de 1945, vinha assumindo o cargo de Vice-Presidente da Câmara Municipal, e, em muitas ocasiões, o de Presidente.
David dos Santos, na sua qualidade de novo Presidente da Edilidade corvina, em regime de substituição efetiva, face ao falecimento em 1952 de Manuel José de Avelar, dava a sua primeira entrevista jornalística ao jornal “Portugal Madeira e Açores”, de 23 de Abril de 1952, através da qual, com a sua simplicidade, para além de referir a pobreza das receitas do seu concelho, evidenciava o seu plano de empreendimentos e as carências da ilha do Corvo. Assim falou, designadamente, da estrada da vila ao Caldeirão, do Edifício dos Paços do Concelho, das repartições públicas da ilha, da falta de médico e das beneficiações da sua residência, da escassez das receitas para manter funcionários municipais, da falta de obras do porto da Casa e das dificuldades na ligações marítimas com a ilha (as ligações aéreas nem eram um sonho) 3.    
E foi assim que, apesar das dificuldades financeiras da ilha, foram levadas a efeito, entre outros, os seguintes empreendimentos: 
– construiu-se e inaugurou-se o edifício dos Paços do Concelho, nele se integrando a Repartição de Finanças e a Tesouraria da Fazenda Pública; 
– construiu-se ou reparou-se uma casa para o médico, com consultório para os primeiros socorros; 
– iniciou-se a construção da estrada da Vila para os matos, com destino ao Caldeirão, concluindo-se em 1957 cerca de três quilómetros, do Ribeirão à Ribeirinha de Manuel Verde e desta à Cancela Nova do Baldio;
– concluiu-se nesse ano a construção do Caminho Nacional do Leste, com a pavimentação de cerca de quatro quilómetros 4; 
– procedeu-se à instalação de água potável pelas ruas, chafarizes e casa dos corvinos que o desejassem, graças à decisão do Ministro de Obras Públicas, Eng.º Arantes e Oliveira, que no início da década de 1960 visitou a ilha do Corvo;
– electrificou-se toda a Vila, com verbas concedidas pelo mesmo Ministro, a pedido do Governador Civil da Horta, Dr. António de Freitas Pimentel;
– melhorou-se a construção do Porto da Casa, abandonando-se o Porto do Boqueirão, e melhorou-se o Cemitério da Ilha. 
Realizaram-se outros empreendimentos, mas estes foram os mais significativos. 
Em 1957 David dos Santos representou a Câmara Municipal do Corvo na reunião distrital que o Governador Civil da Horta promoveu nesta cidade, para análise dos problemas e necessidades do Distrito. 
Nesse ano de 1957 recebeu no Corvo a visita do Presidente da República, General Craveiro Lopes, tendo recebido outros membros do Governo da República do seu tempo, designadamente o Ministro de Obras Públicas, Eng.º Arantes e Oliveira, o Secretário de Estado dos Serviços Agrícolas, Eng.º Vitória Pires que aprovou a instalação no Corvo e nas Flores dos Serviços Florestais. 
Em 1962 também recebeu a visita do Presidente da República, Contra-Almirante Américo de Deus Rodrigues Thomaz, na sua primeira visita ao Corvo.
Até Outubro de 1965 esteve como Presidente da Câmara Municipal do Corvo, inicialmente sem nada receber, e, mais tarde, com uma gratificação de 500$00 por mês. 
Durante cerca de 20 anos também foi Provedor da Santa Casa da Misericórdia do Corvo, cargo que desempenhou entre 1950 e 1960, servindo a instituição com acerto e bondade. 
David dos Santos era prestável e bondoso. Muitos foram os forasteiros que, de passagem pelo Corvo, se sentaram, gratuitamente, à sua mesa, num período em que na ilha não existia qualquer tipo de restaurante, café ou tasca que servisse uma refeição ligeira a quem ali desembarcasse durante a permanência do navio. Fazia-o na sua casa a conhecidos e a desconhecidos, de forma amiga e hospitaleira, como aconteceu comigo e com todos os que certa vez ali desembarcámos a caminho das Flores. Na sua casa comemos gratuitamente um lauto pequeno-almoço onde a mesa estava à nossa disposição servida com café, leite, queijo, manteiga, torresmos, pão de milho e de trigo, gesto esse que soubemos ter-se repetido noutros dias com passageiros em trânsito, como referimos. 
  David dos Santos, depois da política ficou apenas afeto ao seu comércio até que, em 1975, fixou residência na cidade da Horta, onde, já viúvo, ficou a viver com o filho, a nora e as netas, e ainda com duas cunhadas que com ele sempre viveram. Aí convivia com um pequeno grupo de amigos, mas a sua casa, agora dirigida pelo filho, estava sempre aberta a qualquer corvino que a procurasse.  
Viria a falecer na cidade da Horta em 15 de Maio de 1998, junto da família que, carinhosamente, o tratara até ao fim da vida. 

 
Bibl: Trigueiro, José Arlindo Armas, artigo no jornal “Telégrafo”, Horta, de 30-5-1998, e “Histórias e Gentes da Ilha do Corvo”, (2011), pp172-175, ed. da Câmara Municipal do Corvo. 
1 Jornal “As Flores”, Santa Cruz das Flores, de 20-10-1945.
2 Jornal “As Flores”, Santa Cruz das Flores, de 9-8-1941.
3 Jornal “Portugal Madeira e Açores”, Lisboa, de 23-4-1952
4 Jornal “Correio de Horta”, Horta, de 24-7-1957.

 
 

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