Dia Mundial da Poesia – ESMA homenageia Vitorino Nemésio

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 Vitorino Nemésio nasceu em 1901, na ilha Terceira. Frequentou o liceu em Angra e também na Horta, onde concluiu o 5.º ano, entre maio e agosto de 1918. 

Essa passagem pelo Faial serviu de mote à palestra que Victor Rui Dores, proferiu no Auditório da Escola Secundária Manuel de Arriaga (ESMA), para assinalar o Dia Mundial da Poesia, que se celebrou sexta-feira, 21 de março, intitulada “Vitorino Nemésio e a cidade da Horta”.

 

Vitorino Nemésio chegou à Horta em maio de 1918, com apenas 16 anos. Trazia na bagagem a intenção de concluir o curso do 5.º ano do Liceu, uma vez que na sua ilha mãe as coisas não lhe corriam bem. Nemésio teve problemas no Liceu da Terceira, foi expulso, reprovou o ano e resolveu vir ao Faial realizar os exames, como aluno externo, no então Liceu Nacional da Horta.

No Dia Mundial da Poesia, Victor Rui Dores recordou na ESMA a passagem de Nemésio pela Horta, mostrando também ao público, pela primeira vez, o Termo de Exames dos Alunos Externos do Curso Geral,  com os resultados das provas escritas e orais obtidas por Nemésio no exame do 5º ano, que encontrou numa das suas passagens pelo sótão das antigas instalações da ESMA. O documento, revelou o palestrante, já foi partilhado com vários museanistas e é considerado um pequeno contributo seu para a biografia de Nemésio. 

Nesta palestra, o professor fez uma abordagem à maneira como Nemésio retrata toda a cidade da Horta na sua obra de ficção Mau Tempo no Canal. 

Dores lembrou que Nemésio não era um aluno exemplar e só passou nos exames por complacência do então reitor do liceu da Horta, Florêncio Terra, professor de matemática que lhe deu 10 à disciplina; e do Barão de Roches, que também lhe deu 10 a ciências, permitindo-lhe assim concluir o Curso Geral dos Liceus, no dia 16 de julho de 1918, com a qualificação final de 10 valores, Suficiente. 

Nemésio tinha apenas 16 anos nessa altura mas dava já que falar pela sua qualidade, como explica Rui Dores: “era já um poeta incipiente a fazer a sua iniciação poética; tinha já três livros publicados”, revela. 

O palestrante conta que O Telegrapho dá conta da chegada e partida de Nemésio ao Faial, o que Rui Dores justifica com o facto do autor ter oferecido o seu primeiro livro – Canto Matinal – a Manuel Emídio Gonçalves, na altura diretor do jornal.

A estada de Nemésio na cidade da Horta durou de maio a agosto de 1918. Durante esse período, o jovem já medianamente conhecido é muito bem tratado e vai conhecer, na Horta, pessoas que são marcantes e de quem falará, mais tarde, no seu romance Mau Tempo no Canal, como por exemplo, o Maestro Simaria, a quem Nemésio se refere como Sigmalia.

De acordo com o palestrante, nesta sua obra editada em 1944 o autor quer dar a conhecer os Açores. “O Mau Tempo no Canal é uma obra genial porque na altura o autor tinha uma enorme necessidade de dar a conhecer os Açores e de facto esta não é uma obra muito fácil porque tem tanta informação”, explica Rui Dores, frisando que “o Mau Tempo no Canal é muito mais que um simples romance; ele coloca lá a ciência, história, imaginário…”.

No entender do palestrante, Mau Tempo no Canal “é uma grande obra, considerada uma das obras-primas do século XX, e curiosamente é uma obra tão genial que Nemésio, depois de a ter escrito, nunca mais voltou a escrever romances. Escreveu novelas, contos, dispersou-se porque ele era professor catedrático, andou de país em país, fez muito ensaio, muita crónica, mas romance, ele não voltou a escrever”, disse.

Victor Rui Dores explica que este tipo de palestras têm por finalidade a aproximação da escola à comunidade. “Há um dia em que a comunidade vem à ESMA, que é o Dia da Escola, a 15 de maio, mas o nosso objetivo é sempre que possível trazer a comunidade à escola para que esta não se feche no seu espaço”, explica o professor, para quem esta é também uma forma “de convidar as pessoas a estarem connosco e a refletir um pouco do que somos, no fundo ler o Mau Tempo no Canal é falar de nós próprios, da nossa história”.

Este tipo de iniciativas contribui, entende Rui Dores, para divulgar “gente nossa, de grande qualidade, que está um bocadinho esquecida”. Neste contexto, o professor anunciou a intenção de, no Dia da Escola, apresentar um trabalho sobre o poeta terceirense Emanuel Félix, falecido há menos de 10 anos. 

Entre os vivos também estão, frisa Rui Dores, muitos escritores, nos Açores e fora deles, a escrever sobre as ilhas: “tenho uma lista que já é conhecida como a lista de Victor Rui Dores, que tem quatrocentos e tal nomes de pessoas que hoje vivas, nos Açores ou fora dos Açores, escrevem Açores”, disse.

Neste contexto, o professor considerou que é preciso levar os Açores e a literatura açoriana além-fronteiras. “Há um imaginário riquíssimo nestas ilhas, que leva as pessoas a escreverem”, frisa, considerando que os Açores “são um espaço de criação, de criatividade e de ciência”.

Tendo isto em conta, o professor lembra um conselho de Vitorino Nemésio: “sermos universais a partir das ilhas”. Mau Tempo no Canal é, para Rui Dores, um bom exemplo desta possibilidade. “O Faial foi sempre, pela sua história, uma ilha multiétnica, multicultural: tivemos os flamengos, a família Dabney, as esposas dos capitães das baleeiras norte americanas, os estrangeiros e as estrangeiras dos cabos telegráficos submarinos, os rebocadores holandeses, hoje temos a marina oceânica mais internacional do mundo… Somos de facto uma cidade cosmopolita e aprendemos ou devemos aprender com a lição de Vitorino Nemésio”, entende.

A finalizar e defendendo a teoria de que é preciso levar os Açores além fronteira, Dores recomenda a tradução em inglês do Mau tempo no Canal de Francisco Cota Fagundes de Português para Inglês, intitulada Stormy Isles: An Azorian Tale.

 

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