Eleições nos Açores devem ser adiadas se houver prolongamento de restrições

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Em ano de eleições legislativas regionais nos Açores, mesmo sem enquadramento legal, alguns especialistas concordam que, em cenário de prolongamento da pandemia, a melhor solução é adiar o ato eleitoral, garantindo a “autenticidade democrática e de igualdade”.

Para o constitucionalista Jorge Miranda, “seria uma catástrofe nacional, e mundial, se isto continuasse até outubro”, altura em que se realizam habitualmente as eleições legislativas regionais nos Açores, mas, caso se mantenham algumas restrições nas liberdades de circulação e manifestação, “não deve haver eleições”.

“É uma posição talvez radical, mas acho que é uma garantia de autenticidade democrática e de igualdade”, afirma o especialista, em declarações à Lusa.

O professor catedrático da Universidade de Lisboa e da Universidade Católica Portuguesa confessa “dizer isso com toda a prudência”, admitindo que, “se fosse estado de sítio, não teria a menor dúvida – aí, teria de haver adiamento das eleições”. Porém, para o estado de emergência, não há “nenhuma norma jurídica que preveja essas situações”.

“A vida está sempre a trazer-nos novidades, por isso o Direito nunca pode prever tudo”, justifica.

No seu entender, “havendo restrições à liberdade de manifestação e de circulação, não deve haver campanha eleitoral e, portanto, não deve haver eleições”, já que “poderia haver igualdade nas campanhas, mas não igualdade para os eleitores – e são mais importantes os eleitores do que os candidatos”.

Também o constitucionalista Paulo Otero considera que, se houver um pico na altura das eleições, estas devem ser adiadas, “não tanto pelos efeitos no dia da votação, mas sobretudo por comprometer a plenitude da campanha eleitoral”.

“O ideal era que a campanha se realizasse fora de uma situação de estado de emergência”, acrescenta

O adiamento “seria uma situação sem precedentes, como tudo o que se tem estado a viver nas últimas semanas”, e a Constituição “nada estabelece sobre atos eleitorais” nestas circunstâncias.

Segundo o professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, “nada impede, numa situação de consenso – entre as forças político-partidárias, mas também entre os próprios órgãos envolvidos no ato eleitoral, designadamente o Presidente da República –, que as eleições pudessem ser adiadas alguns meses ou algumas semanas, para um cenário de maior estabilidade social”.

Otero destaca que “nenhum país consegue sobreviver estando estes meses todos numa situação de confinamento severo, como é a situação existente” e que, “mesmo que ocorra uma situação ainda de pandemia, será com uma limitação atenuada nas liberdades, designadamente na liberdade de circulação”.

Se se mantiver as eleições com esse condicionamento, sublinha, a “abstenção é outro dado a ponderar” e alternativas que passem pelo recurso a meios digitais para a campanha eleitoral ou para o próprio ato de voto trariam “problemas graves de igualdade ao nível do eleitorado, porque há um eleitorado que tem acesso aos novos meios de comunicação e há outro que não tem”.

O problema, corrobora o politólogo António Costa Pinto, não está apenas na limitação da vida política interna dos partidos – neste caso a seleção nos partidos -, mas surge “caso existam condicionantes ainda na data das eleições, na capacidade de usar todos os meios ao dispor numa campanha eleitoral”.

“Trata-se de uma questão de participação eleitoral. Mesmo que fossem encontrados mecanismos, Portugal é uma sociedade estratificada socialmente, em termos de acesso a meios informáticos. Seria preciso que eles fossem colocados gratuitamente ao serviço da comunidade eleitoral, o que é tecnicamente impossível neste momento”, defende o investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.

O politólogo crê que, num cenário semelhante ao que se vive hoje, “se justifica o adiamento” e lembra que “votam em Portugal, fundamentalmente, os mais velhos, que têm uma participação eleitoral muito superior à dos mais jovens”.

Logo, o adiamento é mais relevante “caso o confinamento se mantenha por largos meses para um segmento fundamental da sociedade portuguesa” como os idosos.

Acerca dos impactos políticos da pandemia de covid-19, refere, “os atos eleitorais são sempre atos de avaliação sobre a gestão política”.

“Numa conjuntura de pandemia, mas sobretudo numa conjuntura imediatamente após, ou seja, sobre as consequências económicas dessa pandemia, isso conduz a uma grande incerteza e vai aumentar a incerteza nas atitudes eleitorais da sociedade, muito mais marcadas pela conjuntura do que pela fidelidade de voto e outras clivagens que atravessam as dinâmicas eleitorais”, acrescenta.

Nas eleições legislativas regionais são escolhidos os 57 deputados que terão assento no parlamento açoriano, por nove círculos eleitorais – um por cada ilha dos Açores e um círculo regional de compensação.

A data em que se realizam é definida pelo Presidente da República, com a antecedência mínima de 60 dias, ou, em caso de dissolução, com a antecedência mínima de 55 dias e realizam-se, tradicionalmente, num domingo entre 28 de setembro e 28 de outubro

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