Não matarás

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Presidente Honorário do PS/Açores, Carlos César, é um dos principais mentores e ativistas do processo de legalização da eutanásia em Portugal.
Esta posição não era expectável. Em primeiro lugar, é preciso ter em conta que o PS não incluiu esta questão no seu programa eleitoral. A eutanásia não é uma questão qualquer. Para muitos portugueses, entre os quais me incluo, uma eventual alteração do quadro legal nesta matéria constitui um ato muito grave. Afeta o núcleo fundamental dos valores éticos nos quais eu, e muitos outros, acreditamos. Não é uma questão circunstancial.
O deputado Carlos César não informou, deste seu propósito, os eleitores açorianos que o elegeram. Estou convencido que muitos eleitores açorianos, que votaram no PS/Açores nas últimas eleições legislativas nacionais, não o teriam feito se o Programa Eleitoral de então contemplasse o propósito de legalizar a eutanásia. Este ato do PS/Açores (do seu cabeça-de-lista pelo círculo eleitoral dos Açores) representa um ataque cobarde e uma traição à democracia representativa.
O que o PS e os seus governos – o de cá e o de lá – deveriam fazer é melhorar a rede de cuidados paliativos. Mais de 70% dos portugueses que necessitam de cuidados paliativos não têm acesso aos mesmos. Esta deveria ser a questão fundamental. No entanto, uma parte dos políticos portugueses revelam apenas aptidão e interesse para apertar o gatilho.
Sou cristão. A vida humana é, de acordo com a minha fé, inviolável. Não matar é um dos Dez Mandamentos da Lei de Deus. Para mim, a legalização da eutanásia é inconcebível e inaceitável. Olho o debate desta questão, lançado pelos que se intitulam progressistas – PS, BE e PAN – como algo absolutamente incompreensível e demoníaco.
Em primeiro lugar, a História mostra que esta questão não é nada moderna. A partir de 1939, a Alemanha Nazi lançou um ambicioso programa de eutanásia, que veio, posteriormente, a ficar conhecido como a “Ação T4”. A designação T4 foi retirada do endereço berlinense da instituição que executou o programa de eutanásia nazi: a “Gemeinnützige Stiftung für Heil- und Anstaltspflege”, que significa, em português, a “Fundação de Caridade para Cuidados Institucionais”.
Tal como acontece com as propostas e as descrições dos “progressistas atuais”, o programa de eutanásia nazi visava, de acordo com os seus promotores, proporcionar, após exigentes diagnósticos, uma “morte misericordiosa” aos doentes considerados incuráveis. Em 1941, o Programa T4 foi oficialmente abandonado devido aos crescentes protestos da população. Sabe-se hoje que o programa de eutanásia nazi continuou a executar-se, embora de forma institucionalmente menos visível, até à derrota do regime, em 1945. Durante a sua vigência foram assassinados milhares de crianças e de adultos.
Mais recentemente, a legalização da eutanásia em países como a Holanda, a Bélgica e o Luxemburgo, demonstrou o que nos espera assim que se aprovar o início do processo. A lei holandesa previa, inicialmente, a eutanásia apenas para doentes terminais, em circunstâncias muito estritas. Iniciado o processo, o âmbito da eutanásia holandesa alargou-se a doentes não terminais, a pessoas com a síndrome de Down, a menores, a pessoas com doenças mentais e até a situações pontuais em que não existe consentimento por parte dos doentes.
O processo continua, no entanto, a alargar-se. O jornal “Público” noticiou, no dia 14 de outubro de 2016, que a “Holanda prepara o suicídio assistido de idosos que sintam que a vida chegou ao fim. A medida destina-se a pessoas que sentem que completaram a sua vida, revelaram os ministros da Saúde e da Justiça”. Alguns relatórios recentes indicam que, na Holanda, “as mortes por eutanásia têm vindo a aumentar progressivamente. O número de mortes por eutanásia e suicídio assistido chegou, em 2013, aos 4.829”. Em que ponto estará o processo daqui a 40 ou 50 anos?
Os que defendem a eutanásia pretendem derrubar o princípio da inviolabilidade da vida humana. Derrubado o princípio, a vida passa a ser medida pela fatal subjetividade da organização estatal e dos seus agentes jurídicos, médicos e políticos. É o início de uma viagem sem retorno em direção a um mundo darwiniano, em que apenas sobrevivem os mais fortes e os mais ricos. Os mais pobres, os mais fracos, os dependentes e os idosos não têm lugar neste novo mundo.
Não aceito em nenhuma circunstância, quer seja num processo legislativo normal ou no âmbito de uma decisão tomada em referendo popular, a legalização da eutanásia no nosso país. Admito que o referendo possa ser reivindicado por setores políticos e sociais que pretendem parar uma maioria parlamentar que não representa – estou convencido disso – a opinião maioritária do Povo Português neste assunto. Mas eu não posso reivindicar esse referendo porque não estou disponível para aceitar uma eventual aprovação da eutanásia por via referendária. É uma questão ética e de fé, que não depende de uma maioria política ou social conjuntural.

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