A EUROPA MAL-AMADA

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1 Por força das funções que exerço, ao longo dos últimos quatro anos percorri os dezanove municípios dos Açores. Nas reuniões, com todos os executivos camarários, para além de muitas outras questões, procurou-se saber os principais e mais mobilizadores projetos que tinham em carteira para o seu município. Sem exceção, foram-nos descritos e apresentados uma pluralidade de investimentos que, uma vez concretizados, constituirão, esperam os seus autarcas, uma significativa mais-valia para cada um desses municípios das nossas nove ilhas. Mas, para efeitos da reflexão que hoje aqui trago, o que retiro dessas reuniões é que, também sem exceção, todos os projetos mais emblemáticos, importantes e estruturantes estavam a aguardar ou a aprovação, ou a abertura de candidatura ou o arranque de um qualquer programa comunitário que os cofinanciasse. Não andarei muito distante da realidade, se afirmar que as autarquias dos Açores, nas atuais circunstâncias económico-financeiras, sem o recurso às verbas dos fundos que nos vem da Europa, muito pouca disponibilidade financeira teriam para fazer investimentos de média dimensão nos seus territórios. Por outras palavras, sem os dinheiros que nos vêm da Europa, as 19 Câmaras dos Açores pouco mais fariam do que gestão corrente, manutenção e pequenos investimentos. 2 O mesmo se diga do Governo Regional dos Açores. Sem as verbas que lhe vem dos Fundos Comunitários, a sua ação em termos de investimento público cairia, como caiu, a pique! Veja-se o que aconteceu com este Governo de Vasco Cordeiro/Sérgio Ávila, que agora está a terminar funções: questionado, em todas as ilhas, porque não cumpriu as suas promessas eleitorais no mandato, a resposta é quase invariavelmente a mesma – o governo “apanhou” um período difícil, de transição de quadros comunitários de apoio, em que houve que fechar os anteriores e esperar pelo lançamento dos atuais e, por isso, teve que fazer um compasso de espera para agora poder reiniciar o lançamento dos projetos prometidos nos manifestos eleitorais de ilha! (Agora também não é local para desmontar a falsidade da argumentação, pois em 2012, quando o PS prometeu o que prometeu, já sabia que isto iria acontecer!…) Por outras palavras, sem os dinheiros que nos vêm da Europa, também o Governo Regional pouco mais faria do que aquilo que fez neste mandato: gestão corrente, manutenção e pequenos investimentos. 3 Mas se alargarmos a nossa análise, e salvaguardarmos sempre as devidas proporções, ela é também válida para todo o País. Sem os dinheiros que nos vieram da Europa nestas décadas, estaríamos longe de poder ter tido o progresso e crescimento que efetivamente tivemos. Sem os fundos comunitários, que a pertença à Comunidade Europeia nos faculta, estaríamos confrontados com décadas de atraso e hoje seríamos uma sombra do que somos. Mesmo e apesar de não caber agora aqui avaliar se esses fundos foram ou não bem aplicados, ou canalizados para onde deveriam ter sido… É, portanto, indiscutível a importância factual que a Europa tem para nós. Sem ela, nem o governo de Portugal, nem os governos dos Açores e da Madeira, nem os 278 municípios de Portugal Continental, nem os 19 municípios dos Açores, nem os 11 da Madeira, teriam podido fazer o que fizeram em termos de investimento público. Isto para não falar nos apoios a empresas e a investimentos privados! 4 Causa-me, por isso, profunda estranheza testemunhar e ver nalgumas declarações de responsáveis políticos, nas posições de partidos políticos do arco parlamentar e em muitos cidadãos um desamor e, mesmo uma hostilidade inusitada, para com a Europa e para com alguns dos países que mais contribuem para que nos chegue o dinheiro que nos tem chegado! E não acredito que seja por falta de conhecimento da realidade que atrás descrevi, pois, esses políticos e esses partidos têm autarcas e eles sabem o que significam nos cofres do seu Município as verbas dos fundos comunitários. 5 Mesmo no meio da crise atual, das dificuldades do momento presente e das disfunções que existem no interior da União Europeia (a exigir, naturalmente, correções e aperfeiçoamento), este desamor pela Europa de que quisemos fazer parte tem muito de incompreensível e muito de aproveitamento político e de demagogia. A Europa tem uma população de 500 milhões de habitantes, que representa pouco mais de 7% da população mundial. Mas, apesar desta sua dimensão, a Europa que muitos criticam e apoucam tem 19,4% do PIB mundial, enquanto que os Estados Unidos têm cerca de 18,9%. A China representa 14,92%. Juntos, a União Europeia e os Estados Unidos têm cerca de 800 milhões de pessoas. Tal significa que a 11,5% da população mundial corresponde quase 38,3% do PIB mundial! Por outro lado, a União Europeia que muitos põem em causa, é o local do planeta onde melhor se vive, com mais direitos sociais, ambientais, mais tolerância e liberdade. E se tivéssemos plena consciência que as estradas onde passamos, os portos que usamos, o tratamento das águas residuais de que beneficiamos, as creches, os lares, os hospitais, as escolas e as universidades que estão ao nosso dispor, a formação profissional, as bolsas de estudo, os programas de apoio à juventude, o apoio às Pequenas e Médias Empresas que existem, são tudo, entre muitos outros, financiados pela União Europeia, então, seríamos certamente menos ligeiros em pôr em causa a Europa. Portugal, desde a sua adesão, já recebeu mais de 63 mil milhões de euros na política de coesão. Até 2020 terá recebido mais de 83 mil milhões de euros em ajudas comunitárias. Então porquê o sentimento de hostilidade e de desamor de alguns contra esta Europa? Porque ela é para eles uma mal-amada? Porque, na minha opinião, esses políticos e partidos querem a quadratura do círculo: querem o dinheiro da Europa sem as regras a que nos obrigámos cumprir para a ela pertencer. Querem os benefícios e não querem as obrigações. E isso obviamente não pode ser em nenhuma democracia ocidental, nem sequer na Grécia, como rapidamente aprendeu o “herói revolucionário”, Aléxis Tsípras, quase levado em ombros, há cerca de um ano, por alguns partidos e políticos portugueses e que, para poderem dizer o que dizem, convenientemente esquecem o que faz agora aquele grego a quem quase elevaram à santidade revolucionária… 25.07.2016

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