A Pesca “Acidental” do Tubarão Azul

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A exploração dos recursos naturais dos mares nos Açores faz parte da história da presença humana nesta região. Exemplo disso foi a atividade baleeira que perdurou até à entrada de Portugal na CEE, em 1986, data em que foi encerrada a última fábrica de transformação baleeira nos Açores. Entre 1896 e 1949 estima-se que foram aqui mortas 12 mil baleias e o último cachalote foi capturado em 1987, altura em que já era proibida a caça comercial.
Findo o período de captura, que teve especial impacto económico na ilha do Pico, hoje a observação de baleias e golfinhos tornou-se numa nova atividade marítimo-turística, que atrai, anualmente, milhares de visitantes, representando somente no Faial 13% a 15% do seu PIB local.
A par desta, o Governo Regional dos Açores publicita um novo tipo de interação: “Mergulho com Tubarões Azuis”, regulado por um código de conduta que se tornou numa nova tendência de exploração comercial por parte dos operadores marítimo-turísticos, que daí retiram dividendos.
Esta exploração é, contudo, acompanhada pela atividade piscatória, que se tem vindo a revelar cada vez mais massiva, num número oficial de 408 toneladas anuais totalizadas pela frota açoriana, segundo o estudo científico de 2013 Total Marine fishery catch for the Azores (1950-2010). Este estudo refere ainda que em relação às frotas estrangeiras, na sua maioria espanholas, não existe um registo oficial, mas no entanto, foram avistadas atividades de captura dentro da ZEE Açoriana.
Esta captura está regimentada pelo Regulamento (EU) nº 605/2013, emanado pelo Parlamento Europeu, onde podemos encontrar uma contradição: por um lado defende uma suposta pesca sustentável do tubarão azul ( tintureira ) e do tubarão-anequim, ao mesmo tempo que reconhece, com base em estudos científicos, como a IUCN – União Internacional para a Conservação da Natureza, que estas espécies estão “quase ameaçadas” e “vulneráveis”, representando a tintureira 70% do total de tubarões declarados. Confirma-se na The IUCN – Lista vermelha das espécies ameaçadas, em 2008, que o Tubarão-azul está “quase ameaçado”. Depois disto, não dispomos de dados atualizados, apesar de observarmos embarcações de pesca espanholas a descarregar, assiduamente, tintureira no porto da Horta.
Nos Açores, o tubarão azul, além de ser pescado como “objecto” directo e apetecível repetidamente pelas mesmas embarcações, é a espécie mais vulnerável por ser capturada acessoriamente aquando da pesca de palangre do atum e do espadarte, compreendendo um proporção bastante significativa da captura total. Este dano colateral não deixa de ter um sentido de ironia quando se busca a sustentabilidade deste tubarão. Coincidentemente e lamentavelmente, a semana passada, o próprio governo garantiu isenção aos pescadores da obrigatoriedade de descarga desta pesca “acidental”.
Considerado como umas das espécie de peixes mais migratórias do mundo, e por essa razão apenas, a defesa tem de percorrer e ser correspondida por todos os países que abraçam todo o território marítimo em que a mesma está englobada, sofre de sobrepesca com um declínio de 60% entre 1986 e 2000, e de 5% por cada ano desde 1995.
Este aumento significativo consubstancia a necessidade voraz de um mercado asiático, nomeadamente a de Hong Kong que absorve 50% do mercado mundial, apenas para o consumo das barbatanas deste ser vivo. Virtualmente, o Parlamento Europeu tentou moderar este mercado com o Regulamento nº 605/2013, limitando a remoção das barbatanas de tubarões ainda a bordo, mas não houve qualquer redução após o decreto na sua execução prática ou estatística.
Questionamos como é possível que o Governo Regional consiga conciliar as conclusões de um estudo da Universidade dos Açores e de investigadores do IMAR/DOP, que indicam a presença de uma área de maternidade oceânica do tubarão azul no Atlântico Norte central, numa área considerável dos Açores, e este tipo de pesca, com ausência, por parte do Governo Regional, que faz a apologia da sustentabilidade ecológica do sector das pescas, de um período de defeso para o tubarão azul nesta zona. O Sr. Secretário anunciou na Horta, em Setembro, que 2018 poderia vir a ser o ano recorde para as pescas nos Açores. Afirmou também que o Governo Regional tem “acautelado” o Programa de Recolha de dados para as Pescas financiado pela UE. Pois bem, Sr. Secretário, queremos dados claros sobre quantidades de tintureira descarregadas e pescadas na ZEE açoriana.
Realizou-se no dia 10 de Dezembro do ano passado, no Mónaco, o terceiro encontro de signatários do Memorando de entendimento para a conservação de tubarões migratórios, onde foi submetida a proposta de inclusão do tubarão azul como espécie migratória protegida, emanada pela Convenção para a Conservação de Espécies Migratórias de Animais Selvagens (Nações Unidas). Portugal faz parte desta Convenção desde 1983, tendo assinado em 2016, um Memorando de Entendimento para a Conservação de Tubarões Migratórios. Infelizmente não houve consenso entre os parceiros e a decisão foi adiada.
Vamos continuar por mais um ano a cair na ambiguidade de querer proteger a mesma espécie que pescamos de forma desmesurada. 

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