Criação de rede pública de ‘vigias da baleia’ nos Açores proposta durante seminário no Faial

0
32
blank
DR

Fonte: ATSF

“É preciso contar a história e defender a figura do baleeiro açoriano”. A salvaguarda da narrativa identitária ligada à baleação nos Açores esteve em destaque num debate promovido pela Associação de Turismo Sustentável do Faial.

“Que lugar ocupa hoje a baleação nas narrativas identitárias e na dinâmica cultural e económica da nossa sociedade?” foi a questão que serviu de mote a uma mesa-redonda sobre a forma como protegemos, divulgamos e integramos no quotidiano o património e a tradição baleeira da Região, e que contou com oradores ligados às atividades de preservação do património e museologia, investigação e observação de cetáceos.

Pedro Filipe, proprietário de uma empresa marítimo-turística, propôs a criação de uma rede pública de vigias [local de observação], que “pode ser utilizada de forma mais coerente para dar apoio ao ‘whale watching’”, acrescentando que deve ser da responsabilidade do Governo Regional “recuperar as vigias e os acessos”, ficando a cargo dos operadores marítimo-turísticos o pagamento dos salários dos vigias contratados.

Para o empresário, a criação de redes de vigias pode “contribuir para dispersar [no mar] os barcos que fazem ‘whale watching’”.

Sobre a ligação entre a observação de cetáceos e a baleação nos Açores e a criação de narrativas, lembrou que “os vigias e as vigias são as únicas coisas que transitam da atividade da caça para o ‘whale watching’”, e lamentou que as vigias existentes no Faial se estejam “a perder”. Neste sentido, apontou como exemplos a vigia das Concheiras, no Capelo, que “já foi vandalizada muitas vezes”, e a dos Cedros, que “está fechada”.

Pedro Filipe afirmou que procura contar aos seus clientes a história da baleação nos Açores, salientando a importância de “contextualizar a caça e explicar por que se fez”. “É preciso contar a história e defender a figura do baleeiro açoriano, que transportou com ele um saber e uma cultura que hoje aplicamos de outra forma”, vincou.

Segundo o empresário, os turistas não se interessam apenas pela observação de cetáceos, mas também pela história da baleação, “que valorizamos através da única profissão que se manteve, que é a do vigia; é ele quem nos coloca ao pé do animal”.

“O vigia é a prova viva que a baleação deixou grande riqueza que tem de ser valorizada. Ir para o mar ver baleias ‘nos ombros’ dos vigias só acontece nos Açores”, declarou.

O empresário destacou, ainda, o facto de “na região, ter-se passado da caça para uma atividade de conservação e proteção”, e referiu que “em vez de caçar-se baleia com arpão, caça-se com máquina fotográfica”.

 

Recuperação dos botes reativou memória coletiva da baleação

Foi na primeira década deste século que houve um grande impulso de recuperação do património baleeiro nos Açores. João Pedro Garcia, antigo presidente do Clube Naval da Horta e ex-presidente da Junta de Freguesia do Capelo, teve um papel ativo na recuperação deste património no Faial.

“Pelas comemorações dos 400 anos da freguesia do Capelo, quando fizemos a primeira regata, houve um despertar para a necessidade de resgatar o património baleeiro que estava à guarda da [antiga armação] Reis & Martins, e fizemos um projeto intitulado ‘Resgate da Memória Baleeira’”, contou.

O projeto, que demorou 10 anos, visou a recuperação de botes, da lancha ‘Valquíria’, e da Casa do Bote do Capelo, envolveu algumas freguesias da ilha “com vocação baleeira”, tendo sido estabelecidos, para esse fim, protocolos com o Observatório do Mar dos Açores (OMA) e com o Clube Naval da Horta.

Segundo João Pedro Garcia, foram recuperados quase todos os botes previstos, sendo que cada bote representou um investimento de 35 mil euros, comparticipados em 75% pelo Governo Regional e os fundos EEA Grants e em 25% pela Câmara Municipal da Horta.

O ex-autarca acredita que a recuperação dos botes “poderá ter reativado a memória coletiva, que podia estar adormecida” e defendeu a necessidade de uma maior articulação entre o património baleeiro e o sector do turismo.

A mesa-redonda “A Baleação e o Faial” contou, ainda, com a participação de Carla Dâmaso, coordenadora do museu da Fábrica da Baleia de Porto Pim, de Márcia Dutra, que tem trabalhado no resgate e investigação do património móvel, imóvel e documental das antigas armações do Faial, do cineasta Pedro Bicudo, co-autor do Arquivo de Memórias da Baleação Açoriana, e de Nina Vieira, da Universidade Nova de Lisboa, que tem feito um trabalho de investigação sobre a história da caça à baleia em Portugal, Brasil e África.

O MEU COMENTÁRIO SOBRE ESTE ARTIGO

Por favor escreva o seu comentário!
Por favor coloque o seu nome aqui
Captcha verification failed!
Falha na pontuação do usuário captcha. Por favor, entre em contato conosco!