TRUMP E OS GOVERNANTES QUE TEMOS

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1. O mundo ocidental vive momentos de inquietude e incerteza. Não bastava a economia, a crise, o déficit, as dívidas soberanas, o desemprego, as falências, os escândalos no mundo financeiro e bancário, como, agora, para compor o ramalhete, se junta a eleição, posse e início da governação de Donald Trump nos Estados Unidos.
2. Não se pode deixar de reconhecer, objetivamente, que o estilo, a forma, muitas das ideias, a postura autoritária e os princípios que estão por detrás das medidas até agora tomadas pelo novel Presidente americano introduzem no cenário político internacional dimensões preocupantes, algumas excessivamente empoladas, mas que, em todo o caso, não sossegam os cidadãos.
3. Porém, a verdade é que o Presidente Trump está a cumprir o que prometeu aos americanos em campanha eleitoral. E, obviamente, não podemos condenar nem criticar os políticos que cumprem a sua palavra e honram os seus compromissos eleitorais.
Por isso, a questão, na minha perspetiva, não é tanto o alarme das primeiras medidas que vão sendo conhecidas, nem a personalidade do sucessor de Obama. A verdadeira questão de fundo, aquela que a todos devia verdadeiramente preocupar e fazer refletir é sobre as razões que levaram a que uma pessoa com tal perfil fosse eleita; é sobre as razões que levaram a que aquelas ideias e propostas (que estão sendo levadas à prática) tivessem sido apoiadas por tão grande número de eleitores.
É que não se pode esquecer que Donald Trum foi escolhido por 60 milhões de americanos. E, como bem fez notar António Barreto, esses que nele votaram “não são todos racistas, machistas, bandidos, milionários, fascistas e corruptos”.
4. Se atendermos ao facto que o fenómeno poderá estar em vias de ter réplicas noutros estados democráticos ocidentais, com a consequente afirmação de personalidades que corporizam radicalismos que julgávamos afastados e/ou controlados, então não restam dúvidas que a explicação profunda do enfraquecimento e da anemia das democracias ocidentais tem de ser procurada dentro do sistema que criámos e alimentámos.
O mundo ocidental parece ter-se esquecido da velha verdade de que “as democracias não caem por serem atacadas, não são derrubadas pelos seus inimigos; caem por sua própria responsabilidade, porque enfraquecem, porque se dividem, porque perdem tempo e energias com quezílias idiotas e porque deixam que o sistema político perca de vista as populações (…) e porque consideram que têm o exclusivo da bondade e da compaixão.” (António Barreto).
5. Como é visível, grande parte das democracias ocidentais vive as consequências e os efeitos de políticas que as levaram a afastar-se das pessoas, do bem-comum dos cidadãos, dos direitos universais da pessoa humana, e, como se isso não bastasse, enredaram-se em escândalos mais ou menos localizados, mas que produziram efeitos irreparáveis na honorabilidade e credibilidade do sistema político. Ao mesmo tempo, a força da globalização e da comunicação, lançou na agenda dos políticos um emaranhado e conflituoso conjunto de interesses individuais, de particularismos e de clientelismos, cuja satisfação, afastou as nossas democracias do povo e da maioria dos cidadãos que não se revê nessas medidas.
E é esse afastamento do povo (um problema interno e profundo das democracias ocidentais, traduzido, por exemplo, nas preocupantes taxas de abstenção a grande parte dos atos eleitorais), que está a abrir espaço à penetração daqueles que são seus adversários.
6.Mais do que insultar Trump (já li de tudo: racista, boçal, cretino, sexista, corrupto, inculto, xenófobo, entre outros mimos…) ou os seus semelhantes, interroguemo-nos, antes, sobre a democracia que temos e que dizemos prezar. Interroguemo-nos sobre a forma como aceitamos as faltas de ética, as faltas de princípios, a submissão do interesse comum aos interesses particulares. De como achamos normal aos governantes enviesar a verdade, decidir não com base na justiça, mas na pressão dos grupos. De como achamos normal que as amizades e os interesses se sobreponham ao mérito e à competência. De como gostamos de apoiar políticos não pela seriedade e pela honestidade das suas propostas, mas pelo benefício que delas esperamos obter.
Como cidadãos, interroguemo-nos, pois, não só sobre o que temos feito pela nossa Democracia, mas também sobre o que podemos fazer.
É que no, fundo, na Democracia, somos nós que escolhemos os governantes que temos!…
30.01.2017

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